CHIBINEKO | RESENHA LITERÁRIA

A única certeza que temos é que inegavelmente a morte um dia baterá em nossa porta e, às vezes de forma inesperada, ela levará consigo uma pessoa que faz parte de quem somos e isso deixará um vazio gigantesco em nosso peito. O livro Chibineko: O restaurante das memórias inesquecíveis, conversa diretamente com os leitores que, assim como eu, enfrentam grandes dificuldades de aceitar perdas, sejam elas inesperadas ou não.

Sejam bem-vindos ao Restaurante Chibineko, local aconchegante à beira mar que oferece mais do que uma refeição saborosa, mas afetiva, capaz de proporcionar um último encontro com uma pessoa já falecida enquanto o alimento ainda estiver quente.

A jovem Kotoko Nikki, de apenas 19 anos, acaba sendo mais uma vítima do destino e repentinamente precisa lidar com a morte precoce de seu irmão mais velho, Yuito. Kotoko vive um luto que a consome junto com a culpa, já que ela acredita que seu irmão não está mais neste mundo por sua causa. Na tentativa de livrar a irmã de um atropelamento, Yuito a empurra até o outro lado da rua, mas acaba sendo atingido em cheio por um carro que avançara o sinal em alta velocidade. A ideia de que o irmão se sacrificara para salvá-la lhe perturba diariamente.

Vendo o agonizante sofrimento da jovem, Kumagai, um dos melhores amigos de Yuito, a apresenta o Restaurante Chibineko e fala para ela sobre as refeições afetivas servidas no local e a magia misteriosa por trás desses pratos. Ele a explica sobre a existência de boatos de que quando se come uma refeição afetiva, é possível ouvir a voz de alguém que já partiu, e às vezes, essa pessoa pode também aparecer para uma breve visita.

Inicialmente, a jovem Kotoko acredita que Kumagai esteja se referindo a Kagezen, um tipo de refeição servida para uma pessoa ausente, mais conhecida por estar presente em funerais e velórios no Japão. Ela acredita que talvez esse tipo de prato seja só mais uma forma de trazer conforto aos que ficaram, mas pensar na possibilidade de rever seu irmão é o suficiente para valer a tentativa.

Entre os capítulos da obra, vamos conhecendo novos personagens que vivenciam sentimentos similares envolvendo perdas, nisso, as histórias se interligam e se entrelaçam criando uma narrativa que aquece a alma dos que leem.

A ambientação do livro é capaz de nos transferir do mundo real para as páginas num passe de mágica, nos capacitando até mesmo em ouvir o canto das gaivotas-de-rabo-preto que cruzam o céu e imaginar a rua de conchas brancas que nos leva até o restaurante Chibineko.

Impossível também não mencionarmos a sensibilidade do pequeno Chibi, o gato presente no restaurante que acompanha as pessoas em suas breves jornadas ao outro lado. Em muitas culturas e crenças, gatos são vistos como pequenos guardiões dos lares, capazes de moldar a energia dos seres humanos, filtrando a negatividade do ar, além de serem capazes de transitar entre o mundo dos vivos e dos mortos. Coincidência, não é mesmo? Ou será que não?

Me parece incompreensível como o luto parece ser algo trivial para algumas pessoas, já que lidar com situações semelhantes é uma das maiores batalhas que travo desde a minha infância. Sempre que perco alguém, inevitavelmente me pego pensando se ficou algo que eu gostaria de ter dito a essa pessoa ou o que eu gostaria de dizer caso tivesse mais uma chance de assim o fazer. Por esta razão me conectei tanto com essa leitura.

Aos que convivem com a saudade diária, ou aqueles que procuram respostas na dor da perda, Chibineko nos traz elucidação de como a vida nem sempre nos prepara as melhores respostas, mas ainda assim, é capaz de nos surpreender através das pessoas que cruzam os nossos caminhos, sejam elas por meio do vínculo de sangue ou não. São 176 páginas para nos lembrar de que amar as pessoas de forma incondicional, ainda é a maior preciosidade que temos em vida e no pós.