Comportamento,  Gerando Conversa

Seja uma mulher livre e as pessoas vão colocar quem você é à prova

Se você é uma daquelas pessoas que foge um pouco ou por completo do que se espera de você, em relação a comportamentos impostos pela sociedade, espere ser fortemente julgada, criticada e depreciada. Seja uma mulher livre e isso incomodará muitas pessoas e elas vão colocar a veracidade disso à prova.

Quando decidi ser quem eu sou, defender o que acredito, ser uma mulher independente, focar em grandes sonhos, não me envolver em um relacionamento amoroso sério, tendo a idade que tenho, valorizar muito minhas amizades a ponto de não distinguir a diferença de sangue, fui fortemente julgada. Sim, this is so white people problems, mas não deixa de me afetar. Eu sempre soube que pra me tornar o ser humano que eu admirasse, a mulher que desejasse eu enfrentaria fortes críticas, perderia amigos, perderia colegas, perderia inclusive oportunidades.

O que se espera de uma jovem mulher? Que ela seja dedicada aos estudos, que ela arrume um namorado decente e se mantenha virgem até o casamento, que ela seja uma mulher feminina e vaidosa, que ela use saltos e sandálias, que ela prefira um vestido ou saia ao invés de calças jeans, que essa mulher se case, tenha filhos, seja uma boa esposa e cuide da casa. Se você sair desse caminho, sim, você será criticada. Você será duramente criticada por ser uma mulher independente.

Vim de uma família que perdeu o pai cedo, sim, meu melhor amigo partiu aos meus 9 anos. Precisei assistir a minha mãe que era completamente dependente do meu pai para absolutamente tudo, aprender da noite para o dia as responsabilidades de um adulto além de cuidar da casa e dos filhos. Cresci vendo e ouvindo os traumas da minha avó materna que precisou fazer coisas desumanas para criar três filhas, após dois relacionamentos violentos e abusivos. Cresci ouvindo as duras histórias da minha avó paterna e o quanto o meu avô era um sujeito que todos temiam, inclusive ela mesma. Cresci ouvindo a minha madrinha contar que precisou ajudar a mãe a criar todos os filhos até que todos estivessem aptos a se virarem e ajudarem em casa. Descobri depois de mais velha, como uma das minhas tias viveu uma vida inteira sob violentos abusos e só descobrimos após ela ter adoecido gravemente e partir. Cresci assistindo ao meu redor a relacionamentos desgastados, doentes pelo ciúme, abusivos, brigas atrás de brigas, controladores, infiéis, mas acima de tudo, muito infelizes. Sempre ouvia o quão infelizes eles eram ou estavam, sempre via lágrimas de dor nos olhos dessas pessoas por não serem felizes, por se sentirem sufocadas, mas que preferiam passar por tudo isso do que terminarem a vida sozinhos. Ainda hoje vejo adolescentes e jovens adultos se enfiarem em relacionamentos nenhum pouco saudáveis pelo puro prazer de uma companhia ou status, mesmo que ela seja vazia. Vi pessoas perderem o brilho próprio, a autonomia, a liberdade, o sorriso, o amor próprio, amigos e até mesmo a família, para estarem com alguém. Sério? Sério.

(Reprodução: One Tree Hill)

Eu cresci tentando aprender a ser autossuficiente, a lidar com meus próprios demônios, a aprender a olhar no espelho sem sentir medo ou repulsa, aprendi aos poucos a controlar a minha língua, a minha raiva e o meu impulso, ao mesmo tempo que aprendi como me posicionar e a importância de falar quando necessário. Aprendi o quanto muito do que haviam me ensinado na infância era na realidade errado e precisei me descontruir. Passei por severas situações na infância, duras. Acreditem, crianças e adolescentes podem ser mais cruéis que vocês possam imaginar, alguns que conheci foram capazes de despertar o meu autodesprezo.

A perda do meu melhor amigo (meu pai), me encheu de traumas e tristezas que hoje, com 25 anos, eu ainda tento lidar. Eu e meu irmão crescemos sendo muito cobrados pelo o que ele poderia vir a pensar de nós e a importância que seu suado trabalho teve em nossas vidas, e o quanto mesmo o perdendo, ainda havíamos sido privilegiados pela vida. Essa angústia, essa cobrança, essa perda inestimável, todo o conjunto de tragédias despertou alguns traumas pessoais, alguns transtornos e uma depressão severa que já entendi que sempre irá oscilar. Vaguei um tempo por vales muito sombrios e perdi a vontade de viver por várias vezes, mesmo nunca tendo me faltado nada. Procurava maneiras de criar uma dor física, para que a dor interna fosse adormecida por um tempo e me sentia entorpecida, parada no tempo, vazia, como se não fosse possível ser feliz novamente.

As pessoas não sabem da sua história, elas sabem de pequenos recortes do que você as possibilita saber ou enxergar. Elas não sabem das suas dores e traumas e mesmo assim elas acreditam poderem te julgar, depreciar, espalhar rumores ou falsos testemunhos sobre você. Lembra quando mencionei ter grandes sonhos ainda a alcançar? Pois é, mas o que as pessoas estão mesmo preocupadas em saber é se estou namorando e quando digo que não, minha sexualidade é posta à prova, mesmo todos sabendo que sou heterossexual. Por nunca ter me envolvido em um relacionamento sério, com essa idade, algo só pode estar errado ou eu não sou quem eu digo ser não é mesmo? Está sim, e este erro está em você que julga e inventa mentiras e suposições de vidas e histórias que não lhe desrespeitam. Lembra que eu disse que ser uma mulher independente, com as próprias escolhas, ela sofreria fortes julgamentos? Pois é, já faz alguns anos que passo por isso, e acreditem, cansa bastante, mas sabe o que mais machuca? Quando as pessoas duvidam de quem você é, mesmo você afirmando ser algo e pronto. É ISSO que machuca. Inclusive quando pessoas que te inspiraram a ser quem você é, mas como disse, aprendi que pra ser quem desejaria ser, eu sofreria fortes, duros, injustos e cruéis julgamentos e que perderia pessoas também, e aqui estou.

Pra você jovem mulher que tem medo do mundo e de ser julgada, não tenha não. Vão te machucar sim, você vai sofrer por duvidarem de você, colocarem quem você é ou escolheu ser em julgamento, você vai perder alguns “amigos”, mas vai ganhar a amizade e o respeito de quem precisa e que acredita em você e nos seus sonhos. Você vai ser questionada e posta em dúvida pelas suas escolhas, seu modo de se comportar, seu estilo, sua forma de se vestir, o seu corte de cabelo, sua maneira de falar, sua orientação sexual, a cor da sua pele, sua identidade, seu modo de andar, sua maneira de viver, suas escolhas, os amigos que decidiu manter e os que decidiu abandonar, sua forma de trabalhar, a profissão que escolheu seguir, fazer ou não uma faculdade, ter filhos ou não, se casar ou não e por aí vai. As pessoas invejam aqueles que se arriscam a não aceitarem padrões, aqueles que não tem medo de serem ou se sentires libertos. As pessoas são frágeis, tem seus sentimentos frágeis e suas vidas destruídas pelas suas escolhas e se acham no direito de julgar a liberdade de ser feliz do outro.

Para todos que duvidaram de quem eu sou, criticam minhas escolhas, me julgam, duvidam de quem eu sou ou esperam uma “declaração” ou que eu vá “admitir” algo que eu não sou porque vocês possuem a mentalidade muito restrita e a sexualidade completamente frágil, eu não tenho medo do julgamento de vocês, que sim, me machuca, mas não destrói a mulher que ainda luto pra ser, apenas me fortalece cada vez mais a seguir os meus passos para bem longe de vocês. Eu sei do que sou e não preciso, nem nunca precisarei provar nada a vocês. As pessoas vão te julgar mesmo você tentando ser uma boa pessoa, mesmo tentando acertar.

Você não precisa ser gay, lésbica, preto e preta, trans, deficiente, e por aí vai, para defender o que é certo, basta ser uma pessoa coerente. Nossas diferenças físicas e genéticas não nos segregam como seres humanos, elas nos complementam. Saibamos respeitá-las e defender aqueles que estão sendo injustiçados. Isso é ter empatia, é acreditar que o outro também merece o respeito que hoje eu tenho.

Ser uma mulher independente, forte, auto suficiente e bem resolvida assusta, mas fiquem tranquilos porque .. spoiler alert: vocês ainda vão se espantar muito com os meus feitos e pelo o que está por vir.

  Att,
  Marcella Montanari

Uma jornalista um tanto quanto nerd, apaixonada por conteúdo, música, filmes, séries e afins. Fundou o blog para dividir as alegrias e as angústias de uma vida que surpreende a cada novo capítulo.

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